Homilia de dom Carlo Furno - 08/2014
A seção “Percorrendo nossa história...”, deste mês, volta 30 anos na história, quando o então Núncio Apostólico do Brasil, dom Carlo Furno, esteve em Campo Mourão, na celebração do jubileu de prata da diocese e da dedicação da Catedral São José. Abaixo, a transcrição de sua homilia, no dia 15 de julho de 1984:
Exmo. Sr. Arcebispo Metropolitano, Dom Jaime Luis Coelho
Exmo. Sr. Bispo Diocesano, Dom Virgílio de Pauli
Exmos. Srs. Bispos aqui presentes
Caríssimos Sacerdotes, Religiosos e Religiosas
Caros fiéis.
É para mim motivo de intensa alegria encontrar-me novamente no Paraná e, hoje, nesta querida Diocese de Campo Mourão, que está celebrando, com justo contentamento, dois grandes e importantes acontecimentos de sua história religiosa: a celebração dos 25 anos de criação da Diocese e a solene dedicação de sua Igreja Mãe, a Catedral de São José.
Agradeço ao Sr. Bispo por ter-me proporcionado este agradável encontro com os Srs. Bispos desta Província Eclesiástica, agradeço igualmente os atos de homenagem que me foram prestados como Representante do Santo Padre no Brasil e saúdo com muito carinho aos zelosos sacerdotes e religiosos, bem como a todos os fiéis desta Diocese.
1. Os jubileus, tão celebrados nas sociedades humanas, são uma ocasião propícia a uma parada para a reconsideração do passado, para relembrar os acontecimentos e as pessoas que marcaram sua história, para um exame e uma nova tomada de posição para o futuro e também para celebrar com satisfação as glórias e bons resultados obtidos durante esta etapa, agradecendo a Deus por tudo o que aconteceu de bem nestes anos de Diocese.
Em primeiro lugar cumpre recordar a origem e as razões que motivaram a sua criação e as pessoas que acompanharam e impulsionaram a sua caminhada.
Há 35 anos esta região estava coberta de florestas, que foram desbravadas e transformadas em exuberantes plantações de milho e de soja. Nestes 25 anos houve muitas transformações nesta região devido às migrações vindas de toda a parte e ao desenvolvimento da agricultura, que inicialmente era primitiva e de subsistência, depois veio a época do café e, ultimamente, a lavoura mecanizada da soja e do trigo.
A Igreja acompanhou muito de perto e ao lado do desenvolvimento material houve um crescimento espiritual, com uma Igreja viva e renovada, com o surgimento de lideranças leigas, que influenciaram as estruturas sócio-econômicas.
A Diocese de Campo Mourão foi criada ao 20 de junho de 1959 pela Bula “Cum venerabilis” do Papa João XXIII com o território desmembrado da extinta Prelazia de Foz do Iguaçu. As razões foram realmente poderosas: extensão excessiva, o rápido desenvolvimento demográfico graças às correntes migratórias, a importância comercial, cultural e política da cidade, de modo especial o crescimento das paróquias, das comunidades religiosas, centros de formação e importância das escolas.
Para regê-la, em 17 de outubro de 1959 foi escolhido pelo Santo Padre, Dom Eliseu Simões Mendes, que foi Bispo Auxiliar de Fortaleza e Bispo Diocesano de Mossoró, e trazia uma boa experiência para implantar e acompanhar o crescimento desta Diocese. Após 20 anos de frutuoso trabalho pastoral resignou o governo diocesano, entregando-o nas mãos de Dom Virgílio de Pauli, que desde 1981 vem desenvolvendo o trabalho de seu predecessor. Dom Virgílio de Pauli tem-se esforçado para construir e ativar o Seminário, que hoje iremos benzer, considerando-o como ponto chave e coração para o futuro da Diocese.
O processo de desenvolvimento desta Diocese foi muito acelerado e nestes 25 anos houve transformações impressionantes. A população quadruplicou, surgindo uma nova e florescente Diocese desmembrada do território de Campo Mourão, que é Umuarama.
O Povo de Deus escreveu e está escrevendo uma bela página da “História da Salvação” nestas terras novas do Paraná. Os leigos, após a criação do “Instituto Social Lar do Paraná” assumiram e realizaram um desempenho magnífico na evangelização das populações, levando-as a uma maior vivência cristã e a um maior compromisso com a Igreja.
2. Caríssimos irmãos em Cristo, onde há uma Diocese, há também uma Igreja Mãe, que se chama Catedral. A convite do vosso Bispo venho, com grande prazer, consagrar esta bela Catedral, testemunho de fé e devoção deste povo de Campo Mourão.
Os templos materiais são sempre obra e símbolo da fé de um povo e do seu amor à Igreja. Este templo é a história da fé, da generosidade e da ajuda de quantos contribuíram para a construção do mesmo, fruto de sua generosidade para com Deus. Congratulo-me com o povo de Campo Mourão que tem um templo digno de sua fé e do seu amor a Deus. Com sua solidez ele nos lembra a rocha de Pedro, com sua proteção recorda a segurança de nossa fé em Deus.
Com a consagração desta Igreja declaramos solenemente que este lugar é exclusivamente reservado a Deus e que servirá aos fiéis unicamente para sua participação no culto divino e para a prática de seus deveres religiosos, pois é “morada do Senhor dos senhores e Rei dos reis” (Ap 17,14).
Este templo é também a casa da COMUNIDADE paroquial, onde se realizam os atos mais transcendentes da nossa religião, dos quais se nutre e desenvolve a vida da Igreja. Aqui se celebra o Santo Sacrifício da missa, centro de toda a vida cristã, e se administram os sacramentos, canais da graça e fontes de crescimento cristão. Aqui o católico aprende a ser mais unido, mais fiel, mais perfeito e capaz de praticar o bem.
Cada templo, onde se atualizam os acontecimentos culminantes da Redenção de Cristo, deve ser considerado como o Cenáculo de Jerusalém, como o sepulcro glorioso de Cristo, como o monte, onde Cristo pregou as bem-aventuranças, ou como um oásis de paz e de oração na vida conturbada de hoje.
Uma igreja não pode ser consagrada se não se consagrar, ao mesmo tempo, o ALTAR, porque é em volta dele que se forma, alimenta e cresce a verdadeira Igreja, que somos todos nós. O altar é a parte mais importante e nobre da Igreja e representa Jesus Cristo. É nele que se celebra o sacrifício da missa, o mesmo que Cristo ofereceu na Cruz.
Em seguida são ungidas as doze CRUZES das paredes, que representam os doze Apóstolos que Jesus colocou como colunas de sua Igreja. Temos aí a perfeita união de Jesus Cristo, representado no altar, com Sua Igreja que somos nós.
As paredes são feitas de pedras variadas ou tijolos, bem unidos, lembrando que cada um de nós é uma pedra ou um tijolo deste maravilhoso templo que é a Igreja.
Diz o Vaticano II: “A Igreja é chamada também construção de Deus (1Cor 3,9). A si mesmo o Senhor se comparou a uma pedra que os construtores rejeitaram, mas que se tornou a pedra angular (Mt 21,42). Sobre este fundamento a Igreja é construída pelos Apóstolos (1Cor 3,11). Dele (Cristo) ela recebe firmeza e coesão. Essa construção recebe vários nomes... principalmente templo santo, que é comparado na liturgia com a Cidade Santa, a nova Jerusalém. Pois nela, quais “pedras vivas”, somos edificados nesta terra (1Pd 2,5). (LG 6). E São Paulo, repetidas vezes, afirma que nós somos “o templo do Deus vivo” (1Cor 3,16). No batismo Deus fez de nós sua habitação luminosa pela presença do Espírito Santo. Amando a Deus e aos irmãos, nós fazemos crescer essa luz que, um dia, se converterá na glória do céu.
Portanto, o edifício material, que abriga presença real e eucarística do Senhor e aonde se reúne a família dos filhos de Deus para oferecer com Cristo os sacrifícios espirituais, feitos de alegrias e sofrimentos, de esperanças e lutas, é símbolo de um outro edifício espiritual, em cuja construção somos chamados a entrar como “pedras vivas”. Com Cristo como pedra fundamental, governada pelo sucessor de Pedro e com os Bispos em comunhão com ele, a Igreja se constrói diariamente e se aperfeiçoa até chegar a plenitude em nós, na nossa dignidade de filhos de Deus, que estamos peregrinando até Ele.
Quer dizer que devemos enxergar neste tempo material o símbolo de nossa fraternidade, de uma fraternidade operante, que exige também a implantação de uma autêntica justiça para todos.
O Santo Padre Paulo VI, na mensagem dirigida ao povo mexicano, aos 12 de outubro de 1976, por ocasião da dedicação da nova Basílica de Guadalupe, dizia: “Convidamos a todos para refletir que, enquanto existirem injustiças, o templo agora construído, não está terminado”.
Estas palavras devem ser para nós um incentivo que nos estimule a dar à comunidade cristã uma coesão sempre mais consciente, a sentir como próprias as necessidades alheias e a estabelecer formas concretas de ajuda, a fim de que se torne efetivo o vínculo de fraternidade que nos une.
Além disto, diante da fome de Deus que se nota em muitos homens, e também diante do secularismo que, ora imperceptível como brisa suave, ora como violento ciclone, arrasta a tantos, somos chamados a colaborar na conservação, restauração e construção da Igreja, que tem por missão fazer nascer Cristo nos corações dos fiéis através da evangelização. Esta é uma mensagem de libertação do pecado para a comunhão com Deus.
Que visão maravilhosa nos traz a dedicação de uma Igreja. Partimos de uma realidade material e terminamos na misteriosa construção do homem novo e na obra atualizadora da Redenção.
Meus caros irmãos, este é um dia importante na história desta Igreja, que será recordado todos os anos com uma missa especial. Com a consagração, Deus torna-se mais presente e mais vivo neste lugar e fica esperando por vós. Vinde, pois, mais vezes, frequentemente e com mais confiança a Ele, principalmente nos momentos de dor, porque na casa de Deus “todo o que pede recebe, aquele que busca encontra e ao que bate, abrir-se-á” (Mt 7,8).